Por: Gabriel Inácio
Publicado em: 13/05/2021 08:00 | Atualizado em: 12/05/2021 22:01
Suellen Barbosa, 35 anos, negra e estudante de jornalismo. (Foto: Acervo Pessoal) |
Os registros oficiais ditam que foram 300 anos de dor, sofrimento, humilhação e escravidão. Mas, depois de tantas mortes, separações e injustiças, a abolição da escravidão aconteceu há 133 anos no Brasil, exatamente no dia 13 de maio de 1888. Por muitos, 13 de maio é um dia para se comemorar a assinatura da Lei Áurea, que libertou os negros, já para outros a data se mantém viva para lembrar as desigualdades que ainda hoje, depois de longos anos, persistem.De todas as formas a abolição não foi pensada para os negros. Após a libertação do cativeiro, à época, não foram pensadas políticas-públicas destinadas ao povo preto, não só no Brasil, mas como em outros lugares também. Isso fez com que o nosso país - que foi um dos principais berços do processo escravocrata - cultivasse raízes racistas que são vivas até hoje na sociedade brasileira.
Uma das claras características desse processo que podemos observar é o uso do termo "empregada doméstica", que resgata a ideia da domesticação de negras que no século XVI, que eram domesticadas através da tortura. "A sociedade brasileira não recepciona os negros de uma forma amigável. O processo da fragmentação do sistema escravocrata ainda está entre nós", afirma o pesquisador Gustavo Leitão, Mestrando em educação, culturas e identidades pela UFRPE/Fundaj. Que completa explicando que na sociedade brasileira o sistema de trabalho dos escravos era dividido por gênero. Os homens ficavam com os serviços mais pesados dos engenhos de açúcar, já as mulheres eram designadas as tarefas da cozinha e da casa grande.
"O que me assusta é a imagem romântica que criaram da Princesa Isabel, como a salvadora que assinou uma lei e acabou com essa mágoa da escravidão no país. A lei áurea é uma imagem romântica de grandes nomes, de grandes fatos e grandes feitos. É uma consequência tardia de um processo que começou há 50 anos", argumentou o pesquisador Luiz Gustavo.
Pesquisador Gustavo Leitão, Mestrando em educação, culturas e identidades pela UFRPE/Fundaj. (Foto: Acervo Pessoal) |
Antes, morando nas senzalas, os escravos se viram no meio da rua e tiveram que criar os seus próprios centros urbanos à margem da sociedade elitista. Então foram criadas comunidades, periferias e favelas
"Todo esse processo de término da escravidão tem origem em interesses que datam há quase 80 anos antes da abolição em 1888. Essa luta pelo processo de abolição da escravidão acompanha muitas revoltas no período de regência. Toda essa estrutura de luta abolicionista marca um processo muito longo que vem de fora do Brasil", afirma o historiador.
Segundo o pesquisador, a Inglaterra escolheu o fim da escravidão por uma questão econômica. O escravo era visto como uma ferramenta para os donos de engenhos. No meio de toda essa luta para a libertação, as ideias também ficaram divididas entre três grupos ideológicos que viam e queriam o fim da escravidão de formas distintas.
O primeiro grupo eram dos emancipacionistas, partidários ao fim da escravidão de maneira lenta e gradual; os abolicionistas, mais famosos, queriam a libertação mais imediata dos escravos; por fim, os escravistas eram os defensores do sistema escravocrata e queriam que a escravidão se mantivesse por um longo período, além de reivindicarem indenizações por conta do prejuízo da falta dos escravos em seus engenhos.
Nunca era satisfatório
Moradora do Alto Santa Isabel, na Zona Norte do Recife, Suellen Barbosa, 35 anos, negra, teve toda a sua base de conhecimento galgada na escola pública. Hoje, ela já tem em mãos o diploma da graduação em Gestão de Recursos Humanos e encontra-se no 2° período do curso de Jornalismo. "Algumas pessoas ainda me dizem que eu não sou tão negra assim, por ter traços e cabelos finos. Mas eu tento sempre afirmar a minha negritude", diz Suellen.
A mãe de Suellen, que também é uma mulher negra, teve que começar a trabalhar cedo para sustentar a filha. Um dos trabalhos braçais que ela teve que desenvolver foi o de babá. Desde a adolescência Suellen foi incentivada pela mãe a fazer cursos e continuar estudando para conseguir ter uma vida melhor e estar preparada para as oportunidades que surgiriam mais tarde.
"Eu vejo muita importância na quebra desse ciclo. É uma forma de você não repetir as histórias, só a partir da educação e do conhecimento que nós conseguimos mudar o nosso futuro", afirmou a estudante de jornalismo. Seja na trajetória profissional ou acadêmica Suellen sempre passou por situações em que a sua cor de pele era a questão, a clareza sobre o racismo só veio com a maturidade.
"Quando trabalhei com telemarketing participei de algumas seleções internas para passar de operadora para supervisora, mas esse momento de subir de cargo nunca chegava apesar de perceber que as avaliações tinham resultados positivos, mas nunca eram satisfatórias", contou Suellen.
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